sábado, 21 de setembro de 2013

Mar de Trevas


Faz mesura curvando-se
rente ao beiço do mar e
vê-se refletido em mórbida água,
em uma imagem amorfa,
mística e nebulosa.

No plúmbeo terror do horizonte
Vejo anômalos caminhantes
Demônios nus evocados
Por espectral sombra nefasta

Oferecem seus lúbricos lábios
E conquistam com seus voluptuosos toques
Para ao fim banharem-se em sangue e tripas

Decadentes marinheiros,
Perdem suas apostas
E atiram-se a sofrível morte.

Que lúgubre é o mar de trevas

Tristes são seus moradores.

(Giuseppe Neto)

terça-feira, 17 de setembro de 2013

Homem Morto I

Aqui vos deixo meus dilemas e segredos
antes que o castigo me faça padecer
em desagradável condição.
Se por ventura todo esse caos seja obra de um deus lunático
que perdeu seu foco em suas tarefas divinas ,
- que deveras são mais importantes  do que atormentar um patife como eu -
Queixo-me de que mereci só parte de toda essa loucura.

Encontro-me em quartos vazios freqüentemente,
perdido na infinidade do cosmo.
Meu calhamaço se encontra sob a mesa
servindo de alimento às traças
Enquanto a lâmpada ofusca meus olhos
e cria sombras em nossas costas nuas

O que mais pode fazer um homem amaldiçoado?
Se o cotidiano me despedaça
Se o tédio lança suas garras regularmente
Se não posso ficar parado em lugar algum.
Isso tudo me incomoda!
O vento que outrora fora terno e amigável,
hoje me cansa, atordoa-me.

Cá estou eu, contando as últimas memórias de uma mente lúcida
Se prestes serei apagado, nada sei disso.
Se Serei transportado para o nada,
o nada absoluto  - onde nem eu existo -, nada sei.
Mas ainda assim eu estarei vagando, cabisbaixo pelas calçadas
Não sei com que pensamentos ou olhos eu hei de estar,
Nem se eu hei de ter a mesma sede que tenho hoje.


(Giuseppe Neto)

terça-feira, 10 de setembro de 2013

Entorpecentes

E lá está ele, escondido de suas verdades
um ponto opaco em um universo perturbador,
vivendo um distúrbio por vez
e um delírio por dia.

Acorrentado à pilulas
e negligente com as palavras

Infortúnio que o tratem com desprezo,
Mal sabem o que se passa em sua cabeça.
Sua criatividade, seu dom. Que lhe dá o pão e
que lhe deu suas poucas conquistas
também é seu carrasco.

Ele vê demais
E é eviscerado.

Não há cura para essa tristeza,
uma máscara horrenda que insiste em ficar,
que obriga-o a entorpecer a mente
E acabar - finalmente - com o caos.

(Giuseppe Neto)


sexta-feira, 6 de setembro de 2013

Pétala Queimada

Desabroche fervente pétala
da cor mais singular possível,
tão ínfima e preciosa.

Tempos eu criei
e tempos eu vivi
Em muitos tempos eu gritei
até me render a dor e,
finalmente,
liquefazendo-me em rubra seiva eu estou.

E não na lágrima que cai na folha
ou na ponta da pena que risca, algoz,
o inicio de tudo que virá.
Mas em todas as páginas que foram
escritas e lidas até hoje.

Desabroche, dilacere.
Escuto o estalar do aço,
um aperto em músculo que derrama sangue morno
Escuto o disparo da arma
que come, ávida, minhas entranhas

Queime até o osso, sinta o cheiro
derrame a seiva que arde na pele
Desabroche e chegue ao inferno
-enquanto minha carne definha-.

(Giuseppe Neto)

quinta-feira, 5 de setembro de 2013

Vida

Em uma selva de esculturas,
Todas tortas e decadentes,
Umas perdem os braços e outras, a cabeça.
-Para salvar o mundo de seu câncer! - Exclamam os moralistas,
-Acabem com a farsa! - gritam os velhos, estes, 
que perdem seus filhos para a máquina.

Um aço trepidante que da armas às crianças,
Queima os livros e joga as cinzas nas caras dos homens.
Alguém para salvar este mundo cheio de doentes e hidrofóbicos?
 Homens que se arrastam, escarrando ao chão e deitando em cima,

E não, não tenho repulsa.

Porque eu sou igual a esses homens,
Viro-me de lado e sinto o escarro manchando meu casaco,
Vejo meu corpo se estatelar ao chão e o socorro chegando tarde.

Alguém há de vir por nós, pois que abram as portas
E deixem o ar entrar e levar a gente consigo
-Não há esperança! - uns dizem,
são os primeiros a perecer na tortuosa luta contra a existência.

E há ainda aqueles que rasgam seus ternos e correm na rua,
Destruindo os cartazes políticos ao som de sinfonias.
-Anarquia! - grita a constituição,

-Vida! - gritam os homens.

(Giuseppe Neto) 

Dedico este poema para meu amigo e genial poeta Thiago Nelsis (http://celebracaododesproposito.blogspot.com.br/) porque a ideia deste texto - e de muitos outros - surgiu em uma de nossas conversas regadas a vinho. 

Aqui vai o link do livro dele:

domingo, 1 de setembro de 2013

Madrugada

Eis-me aqui, a mercê de Nix e Morfeu.
Aconchegado sobre o nublado e ébrio céu negro.
Eternizando-me no suave e confortante breu.

Lassidão que domina, Cólera faminta. 
Penumbra insistente, onde encontrei meu próprio ser
Companheira Madrugada, profana e secreta, contigo eu ei de viver.

Primitiva sensação, Existência:
-Que melhor amante do que a própria madrugada?
Ela, que embala o sono dos conventos e cobre os olhos da moral.

Acolhe, Madruga, os poetas
Porque a noite é dos vândalos,
É dos artistas impertinentes que vivem na borda do mundo

Vil Madrugada,
De presença cálida, erótica e misteriosa
Emana tua aura sobre nossos corpos nus.
Nativo brilho da lua, que desperta minha luxúria,
Encanta e infesta-me da pura desordem.

Minha amante Madrugada, que une poetas e putas
Mendigos e loucos, boêmios e outros poucos.


Perigosa Madrugada, que me faz amar. 

(Giuseppe Neto)

Andarilho

Nada mais quero
do que vagar eternamente
pelas ruas de minha cidade,
como um ândalo à toa
com a semblante enegrecida,
um fantasma que respira...

Perder-me  em devaneios
E esquecer do tempo
Que destino dramático
e porque não poético?
Perfeito para alguém patético
que só conhece
o mundo por acaso...

Acenar para todos os que passam
até mesmo para os que não lembram
de minha amarga fisionomia.
Sorrir também para os que desprezam
a minha jovial libertinagem
porque, diga-se de passagem:
Não estamos em tempos de euforia.


(Giuseppe Neto)


Penhasco

O homem estava exausto
pendendo de um lado ao outro
no implacável cume do desfiladeiro.

Cair, escutar o sussurro do vento
Padecer e ser absorvido pelo abismo

Morrer.

Um poeta maldito cansado das conversas do mundo
Do conforto monótono que sentia,
Fez-se o que era esperado, caiu.

A poesia de sua queda foi lúcida
Terminava no escuro.

E desta vez, podia escrever.
E escrevia por quê?
Escrevia porque podia.
Escrevia porque essa era sua sina.

(Giuseppe Neto)


O vigia

Empoleirado, com um olhar impertinente
Vestido de penumbra, 
Com os olhos vermelhos, cheios de eternidade
Observava atentamente
A loucura que se espalhava pelo mundo

O esplêndido liquido rubro
Que vazava dos corpos carecidos de vida. 
E os colecionadores de mentes,
Que suturavam os espíritos assombrados

Insolente, questionava cada alma 
Um macabro Caronte contemporâneo,
Nem vivo, nem morto
Comandado por alguma nefasta sombra

Lá estavam cortesãs, 
Vestidas de luxúria e ódio,
E arquitetos do capricho,
Vaidosos seres desprovidos de sentimento
Eram todos observados
Consumidos por olhos sobrenaturais.

Poetas embriagados
Declamando suas fraquezas,
Heróis quebrando correntes
E homens beijando as faces de seus demônios
Voara sobre eles,
Silencioso e vigilante, respirando o ar
Respirando os odores de fornicação,
E o nauseante cheiro de insanidade

Cruel em seu julgamento
Considerava a todos como párias de um deus desajustado
Não demorou, Voou alto
Ir para um mundo onde as histórias dos seres
Sejam mais simples e menos melancólicas. 
Foi-se, apenas satisfeito.

(Giuseppe Neto)